Tarde de quinta-feira, boteco da Praça Seca. Sete amigos de mais de quarenta anos de amizade. Sete amigos unidos pela fraternidade e pela diversão. Sete solitários por opção. Sete cariocas da gema ambos com mais de 60 anos de idade. Um do Leblon, dois de Ipanema, um da Tijuca e dois de Copacabana, um de Deodoro
Ambos vivendo o pior dilema da vida de até então: se afastarem da rotina de lazer que faziam há décadas. O que fazer agora sem o tradicional churrasquinho quinzenal? O que seria do encontro trissemanário no Arpoador? O que seria do tradicional jogo de dominó com os velhinhos na Praça Seca ou na Praça Sáenz Peña ou ainda em Santa Tereza em quase todos os dias? As idas semanais à feira de São Cristóvão? Tudo em cheque agora graças à porcaria do Coronavirus.
Todos tinham a consciência de que era preciso se isolar. Ainda mais que a idade de ambos ultrapassavam os 60 anos. Então, nesta semana, tinham que tomar uma decisão. Papo reto:
─ Esse é o nosso último encontro! ─ murmurejou Bastos, o mais velho de todos: 93 anos de feliz existência.
─ Tu tá dando prá traz agora Bastos? Pensando em morrer? Não! De tu, eu não esperava ouvir isso. Tu é pessimista por natureza, mas hoje tu foi além do teu mórbido pessimismo.
─ Se não tomarmos vergonha e entrar no nosso confinamento, esse será nosso último encontro mesmo. ─ Ponderou Gomes.
─ Mas vamos sim morrer confinados de tédio. ─ Ponderou Chiquinho, o mais novo do grupo: sessenta e três aninhos.
A conversa era tensa. Ninguém tinha cabeça para jogar dominó ou baralho. O que fariam neste isolamento?
Foi de Gomes, o mais sábio do grupo, que veio a solução: Um vídeochurrasco para este domingo.
─ Como assim? ─ indagaram em coro?
E Gomes, com toda a sapiência que Deus lhe deu:
─Tá na moda fazer videoconferência para tudo. Até as entrevistas do Ministério da Saúde está sendo assim. Amanhã o Senado faz a primeira sessão por videoconferência. A gente contrata um técnico em informática, ele nos passa a informações e pimba! Nos mostra como conectar nosso celular e a tevê e aí, meus caros, amigos, de nossas casas faremos nossas festas.
A ideia foi aprovada por todos. De posse do jornais que tinham em mãos ( qual idoso do Rio não anda com jornal debaixo do sovaco ou na mão?) e, nos classificados, encontraram um técnico.
Resumo da ópera: nesta manhã de domingo, as tevês ligadas, celulares ou câmeras conectadas na internet. Os velhinhos felizes esperando a abertura oficial do videochurrasco.
Às 12 horas em ponto, Gomes, o dono da ideia, em frente aparecendo na tela da casa de todos os velhinhos:
Caros amigos, declaro por iniciada o primeiro videochurrasco do mundo!
Aplausos. Brinde de cerveja com leve toque na tela da Tevê.
Vinte minutos depois, os primeiros pedaços de assados em churrasqueiras elétricas ou churrasqueira de fogão. Os sete velhinhos papeando, gargalhando. Todos felizes como se estivessem juntos. Todos livres da contaminação do coronavirus.
Vald Ribeiro
Valdribeiro@folha.com.br
22 de março de 2020